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Custos invisíveis: não pague para ver

Neste primeiro post do ano, trago um artigo sobre “Custos invisíveis” (algo bem comum em muitas empresas) escrito por Sérgio Ferreira, ex-executivo da Cargill, Michelin, Case New Holland, Nissan e Chrysler. No artigo, ele mostra os perigos dos custos invisíveis, principalmente em consequência do turnover e a pouca importância que gestores dão ao assunto até que as consequências sejam irreversíveis.

Angelo Dundee, antigo treinador de boxe do, possivelmente maior pugilista de todos os tempos, Muhammad Ali, costumava alertá-lo: “O pior soco para receber não é nem o mais forte, nem o mais rápido, mas aquele que você não espera, não vê chegando…”. Assim como vários boxeadores foram a knock-out por não conseguir enxergar o “invisível”, infelizmente muitos empresários e executivos sofrem do mesmo problema: têm dificuldades de enxergar as receitas e custos invisíveis.

Explicarei em detalhes ao longo do texto, mas adianto que a boa gestão requer uma leitura atenta dos números visíveis, entender os números que não aparecem nem nos DREs (Demonstração de Resultados no Exercício) nem nos balanços – os invisíveis – mas ainda assim são de fundamental importância. A interpretação deve ser precisa e antecede ações preventivas e corretivas. Normalmente fazem a diferença entre gerar lucro ou prejuízo…

Mas vamos com um exemplo prático: retenção de colaboradores, o que em outras palavras significa, baixo turnover (saída) de colaboradores.

Vários estudos sérios (recomendo a leitura do paper do Center for American Progress, eles sintetizam 11 estudos diferentes realizados durante um período de 15 anos), demonstram que perder um colaborador custa para a empresa entre 90% e 200% do salário anual do agora ex-colaborador! É isso mesmo! Vamos imaginar um gerente de vendas cujo salário gira em retorno de R$ 15.000 mensais. Ao perdê-lo, seja voluntaria ou involuntariamente, o custo para a empresa fica entre R$ 180.000 e R$ 400.000!!!

E aqui vem o maior dos problemas: apenas uma fração deste custo é refletido de maneira explícita no DRE da empresa.

A tendência natural quando pensamos nos custos de desligar um colaborador, é lembrar dos custos diretos das obrigações trabalhistas: multa do FGTS, aviso prévio, saldo de férias, 13º e dependendo do nível da posição, muitas empresas oferecem um “pacote” adicional voluntário, o que envolve custos com plano de saúde por um tempo determinado, outplacement, etc. Correrei o risco de ser repetitivo, mas reafirmo: acima estão alguns custos que representam uma fração do custo total real.

Vamos tratar de alguns dos invisíveis:

  • Custo de contratação do substituto externo (quando você, gestor, toma a decisão de desligar um colaborador, leva em consideração os custos com agências de contratação ou headhunters? Custos da hora do seu pessoal interno que poderia/deveria estar sendo investido em atividades de maior valor agregado para a sua equipe ou empresa?)
  • Custo de treinamento do substituto.
  • Custo da produtividade do novo colaborador. É inegável que, por melhor que seja o novo profissional, levará um tempo para que ele se adapte à nova empresa, cultura, processos, produtos, etc. Trata-se do famoso período de “ramp up”. Aqui podemos argumentar que é uma “perda de receita”, mas o efeito prático no resultado é o mesmo. Se vendemos menos e perdemos margem em função da saída de um colaborador, podemos decidir se alocamos na conta invisível de perda de receita ou custo incremental. Mas o fato relevante é que reduzimos o lucro.
  • Custo da produtividade da equipe: o efeito colateral de uma demissão ou de um pedido de demissão, via de regra é negativo para quem fica. No caso de demissão, o receio de que poderá ser o próximo a ser demitido. No caso de pedido de demissão, suscita a dúvida se a empresa atual é mesmo a melhor opção ou se há opções melhores “lá fora”. Em ambos os casos, a perda, ainda que momentânea de foco dos colegas, custa dinheiro para a empresa.
  • Finalmente, voltando ao exemplo do nosso gerente de vendas (isso é muito mais comum em setores em que o relacionamento de longo prazo é um percebido como um diferencial, leia-se TODOS), há o enorme custo/perda de vendas e margens, quando o colaborador simplesmente leva toda ou parte da sua carteira de clientes para um concorrente! Além dos clientes, leva consigo todos os treinamentos recebidos (custo zero para o novo empregador), informações confidenciais sobre estratégia, pontos fortes, pontos fracos, etc. etc.

É difícil quantificar exatamente o quanto financeiramente representa a perda de um colaborador? Extremamente. Porém é muito fácil de compreender a magnitude que um alto nível de turnover (saídas voluntárias e involuntárias) pode causar nas finanças da empresa no curto e médio prazo. O fato de ser difícil quantificar, não isenta o bom gestor da obrigação de minimizá-lo.

Como os custos invisíveis, por definição, não têm “dono”, fica difícil o seu monitoramento e consequentemente a cobrança. Sabemos que quando não há uma gestão focada em um tema, ele costuma ser esquecido…

Estou propondo que turnover zero? Um cenário utópico em que ninguém sairia espontaneamente das empresas? Ou um cenário em que as empresas não deveriam demitir?

Evidentemente que não. A minha proposta é que as empresas tratem o tema da retenção de bons colaboradores como uma das suas maiores prioridades, em todos os níveis de gestão. As demissões de colaboradores com má performance, desalinhamento com os valores e cultura da empresa, são até mesmo necessárias, para abrir espaço para a contratação de talentos possam agregar muito mais valor para a empresa.

Existe um % de turnover ideal? A minha resposta aqui não é numérica. Quando me perguntam, a minha resposta é: o mínimo necessário, apenas para os colaboradores que realmente não se encaixam na empresa, após esgotadas todas as tentativas de coaching, treinamento e motivação (responsabilidade do líder). Ah! Não acreditem no mito de que alguns setores necessariamente têm um turnover mais alto do que outros. O varejo, por exemplo, com frequência (equivocada) é citado como um setor em que um turnover é intrinsecamente mais alto do que outros.

Dados recentes parecem indicar que as melhores empresas de varejo – que enfrentam os mesmos desafios das concorrentes – apresentam nível de turnover muito abaixo do que empresas de setores em que supostamente a rotatividade do pessoal seria mais baixa. Os especialistas da área tendem a acreditar que o foco da alta direção em manter o turnover baixo é um fator mais determinante do que o setor em si.

Aceitar 25% de turnover, matematicamente significa dizer que a cada 4 anos, trocamos 100% do pessoal. Como sabemos que no mundo real, um % dos colaboradores da empresa permanece durante este período, significa que quem sai, passa muito pouco tempo na empresa, muitas vezes, poucos meses apenas! Como criar uma cultura forte e equipes vencedoras neste contexto?

E o que fazer para aumentar o nível de retenção dos seus colaboradores? Aqui as minhas dicas:

  • Capriche na contratação! Percebo que muitos erros são cometidos quando o gestor/RH privilegiam a velocidade em relação à qualidade da contratação.
  • Sabemos que muitos colaboradores, ao se desligarem da empresa, estão na verdade se desligando do seu gestor imediato. A missão de aumentar a retenção de (bons) funcionários não é apenas do RH. De fato, ela é sobretudo do gestor imediato, que precisa compreender bem e “comprar” esta missão como uma das suas mais importantes.
  • Cresça! Isso mesmo. Os melhores colaboradores, principalmente os mais jovens, privilegiam empresas que além de terem planos, demonstram com resultados, a sua capacidade de crescimento. Obviamente, crescimento rentável. Crescimento se traduz em oportunidades e novos desafios para todos internamente.
  • Comunique de forma clara o quanto você valoriza o relacionamento ganha ganha e de longo prazo com todos os stakeholders. Principalmente para os seus colaboradores. Mas além de comunicar, demonstre diariamente isso com respeito e reconhecimento. Uma pequena dica: as pessoas adoram ser chamadas pelo seu nome. Memorize os nomes do maior número de colaboradores que você conseguir e em retorno provavelmente terá um maior nível de engajamento.
  • Crie um bom ambiente de trabalho. As pessoas passam ao menos um terço dos seus dias trabalhando. Ambientes saudáveis, acolhedores e leves, não comprometem a produtividade e a entrega de resultados. Ao contrário.

E você, leitor? Está convencido sobre a importância estratégica de minimizar o turnover? Caso esteja, mãos à obra. Quais ações irá tomar a partir de já?

Caso ainda não esteja, peço 2 exercícios bem simples:

  1. Uma breve reflexão sobre empresas bem-sucedidas, não importa o tamanho, que você conheça. Consegue lembrar de alguns (ou muitos) colaboradores que há anos trabalham nesta empresa? Seria sorte? Coincidência?
  2. Faça uma lista dos colaboradores que saíram da sua equipe nos últimos 12 meses. Ao lado de cada colaborador, o valor do seu salário mensal. Para chegarmos ao custo de 90% a 200%, multiplique o total de salários mensais por 12 e por 27. O menor resultado seria o custo mínimo para a sua empresa e/ou departamento. O número maior, o custo estimado máximo, de acordo com os estudos.

Pergunto: vale à pena pagar para ver?!

Sérgio Ferreira é ex-executivo da Cargill, Michelin, Case New Holland, Nissan e Chrysler. Atualmente atua como Consultor de gestão, Palestrante, Mentor de Executivos e Conselheiro formado pelo IBGC. www.sergioferreiraresultados.com.br

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